PASTOREAR A SAUDADE
MORTOS E NÓS
Há mortos que vivem de saudades, há mortos que ainda imploram por promessas não cumpridas. Há mortos que voltam e outros que se mantêm à distância, os que se afinam com a vida vivida e os que seguem ainda desafinando. Há os que acenam com amargas lembranças e os que dariam tudo para recuperar um instante de aroma, gosto, outros prazeres, ainda que fugidios. Há os que sentem a dor dos outros e os que mesmo mortos, se encerram nas dores próprias. Há os que se libertaram do corpo e, outros saudosos da companhia recriam um corpo fantasma. Há os que lamentam a precoce interrupção que lhe freou a vida e, outros que a abreviaram animando o perigo e a imprudência. Uns guardam livros, pergaminhos, cartas de amor, outros, papel higiênico, promissórias. No seguimento das suas escolhas eles seguem seus destinos, o resto cabe a nós.
Escritos Fenícios
© 2018 Roberto Curi Hallal